Estou para conhecer uma pessoa que ache isso normal, razoável,
aceitável, mas, para resumir, é inconcebível que tenhamos uma média de 10% de
juros ao mês no cheque especial e 16% no cartão de crédito _ só para citar os
mais comuns, fora tudo mais onde juros recaem. Se eu não vivesse aqui, acharia
que é coisa de algum episódio de “Alem da Imaginação” _ os vorazes, implacáveis,
juros devorando a alma dos endividados. É aterrador.
Se você já entrou alguma vez na famosa “bola de neve”, sabe do que
estou falando. Haja gigantesca criatividade brasileira para manter as finanças
em ordem. É um tal de usar o cheque especial para cobrir despesas, o cartão de
crédito para pagar contas, empréstimos para pagar o cheque especial, cheque
especial para pagar empréstimos e cartão de crédito, juros para cobrir juros
gerados por juros de juros de juros... acho que deu para entender. Ou não! A
questão é: chega um ponto em que o torturado ser humano já não consegue mais
dormir à noite; passa pela humilhação de ver seus cartões recusados,
estourados, bloqueados; vê os empréstimos e crédito tão generosamente
oferecidos antes sendo sumariamente recusados na sua cara; vê seus cheques
voltando; é cobrado impiedosamente por credores, é ameaçado de despejo; só
ainda não vendeu um rim... (Endividados têm mesmo essa mania de ficar
oferecendo rim para cá e para lá _ ainda bem que ninguém leva a sério.) É um
poço sem fundo e/ou o fundo do poço. É a fase “Passei por cada papel...” Não há
mais saída, não há mais solução... Os familiares e amigos: a) Já te emprestaram
e não têm mais como ajudar; b) Estão na mesma situação que você e acham que
você dá azar; c) Acham que a culpa é toda sua, te criticam e você que se dane;
d) Fogem de você como o diabo da cruz; e) todas as anteriores.
Então, nesse ponto, quando o poço parecia não ter mais fundo... ainda
tem. É exatamente nesse ponto que o seu bom e respeitável nome vai para o
vinagre. O bom nome que o seu pai te deu, que você deu aos seus filhos, que
espera ver prosseguindo glorioso _ ou ao menos limpo _ ao longo das gerações.
Esse valente brasileiro, essa criatura atormentada, começa a se perguntar: Onde
foi que eu errei? Sou consumista demais, gasto mais do que ganho, não planejo o
orçamento, não economizo, “vou para a galera” às vezes, admito; ganho pouco;
com esse salário não dá para fazer nada; fiz prestações demais... A lista de
recriminações, lamúrias, arrependimentos não tem fim, acompanhada quase sempre
de culpa profunda, ódio de si mesmo, ódio dos outros, ódio dos juros, ódio dos
malditos cartões de crédito. Deixe só eu resolver essa situação que vou picar
todos os cartões de crédito _ incinerar, triturar e jogar o que sobrar no
lixão! É uma das primeiras promessas a si mesmo.
Sem que nenhuma autoridade faça absolutamente nada, esses são apenas
alguns dos efeitos dos juros extorsivos na vida dos brasileiros. Atualmente,
existem cada vez menos investidores e as instituições financeiras e
administradoras de cartões fazem do “crédito fácil”/dívidas um produto dos mais
rentáveis entre sua clientela. No final das contas, aqueles que “pagam
direitinho” acabam pagando é o pato por causa dos maus pagadores. Praticamente
não se negocia com quem “paga direitinho”. Há gente que tem estourar o cartão
para lá do impensável, comer o pão que o diabo amassou (e achar bom _ pelo
menos é pão) para, enfim, depois de meses agonizantes, conseguir um acordo,
quitar a dívida (pelo que devia ser mesmo o seu valor real) e dar início a
batalha para recuperar o seu bom nome.
Existem inúmeras situações que levam as pessoas, voluntária ou
involuntariamente às dívidas, à fatídica “bola de neve” _ desemprego, doenças,
carências, remuneração ruim, impulsividade, consumo excessivo, má fé,
ilusões... O que acredito é que os endividados não devem se desesperar _ o
desespero não leva à nada... de um jeito ou de outro, ele só levará a mais
dívidas, com toda a certeza. Todos os que estão nessas situações devem esfriar
a cabeça, apagar os incêndios na medida do possível e, depois, repensar sua
vida, descobrir onde esteve o erro que desencadeou tudo, a fim de poder
consertá-lo. Sei que é fácil falar, que teoria e prática nunca andam juntas,
que parece realmente não haver saída, mas há. Sempre há uma saída. Fé,
otimismo, pensamentos bons e positivos, autoconfiança, coragem, determinação,
parecem apenas palavras vazias, não é? Mas experimente se entregar à descrença,
ao pessimismo, a pensamentos ruins, ao desânimo, covardia, apatia,
autocomiseração... É aí que a vaca vai para o brejo mesmo. A nossa atitude
perante as situações difíceis faz toda a diferença. Não é fácil. É preciso
coragem para não esmorecer. Mas, em certos casos, o que se tem a perder? O rim
é que não vai ser! A vida é uma só. Então, por que não empregar todo o empenho
para consertar o que precisa ser consertado e seguir em frente, buscando ser
verdadeiramente feliz? Aqui, neste caso, estamos falando de dívidas. Cada caso
é um caso, mas primeiramente, fé e atitude positiva. Depois, fazer de tudo para
limpar o seu bom nome, para recuperá-lo. É a coisa mais sagrada que temos como
cidadãos: o nosso bom nome. Ele, de fato, abre portas e nos ajuda a prosseguir
em busca dos nossos sonhos. (Se o seu nome está sujo na praça, não precisa
arrancar os cabelos neste ponto _ hoje em dia, infelizmente, é a coisa mais
normal do mundo, ninguém liga, todo mundo sabe dos motivos, está quase todo
mundo no mesmo barco.) Mas empenhe-se para recuperar o seu nome; é o primeiro
passo. Fé, atitude positiva, corajosa e determinada e nome limpo. Já está
melhorando, não é? Daí para a frente, lute com unhas e dentes para ser feliz.
Como falei, conserte o que tem de ser consertado e, se preciso for, comece do
zero novamente. A vida está aí, só à sua espera. Trabalhe, estude, planeje,
programe-se. Comece de novo, por que não? Acho que a melhor maneira de
administrar o dinheiro, não importando quanto se ganhe, mas sim o princípio, é
dividindo aquilo que sobrar (que temos de fazer sobrar) _ depois de quitadas as
contas e dívidas _ entre o presente e o amanhã. Devemos investir em estudos,
sonhos e projetos, qualidade de vida e futuro. Temos de trabalhar, mas reservar
o que for possível para o lazer. Ele é a nossa válvula de escape. É complicado,
mas é necessário haver uma poupança de reserva para emergências, nem que seja
depositando uma quantia mensal mínima. E, claro, guardar o possível para o
futuro, para que a mesma situação difícil em que uma pessoa se encontra geralmente
quando mais jovem não se repita numa época em que precisa ter uma vida mais
tranquila. Se de grão em grão, as dívidas crescem, as economias também _ embora
não na mesma proporção.
Essas dicas de como pagar ou não fazer dívidas, fugir de juros,
procurar juros menores quando o caso, comprar à vista, poupar, etc., são
repetidas exaustivamente na mídia _ porque essa é a realidade, não apenas de
brasileiros, mas de cidadãos do mundo inteiro (bem, talvez em Dubai as coisas
estejam melhorzinhas...)
P.S.: No final das contas, são os bons pagadores que acabam
carregando tudo nas costas. Por um lado, sofrem com os juros abusivos, por
outro, são vistos como “fonte certa de capital confiável”, como uma compensação
para os “rombos” causados pelos inadimplentes. Os seguros pagos também servem
para isso. De qualquer modo, o ideal é ser um bom pagador, tanto para a paz de
espírito, quanto para o cumprimento do que é certo, de acordo com os bons
princípios. Mas o ideal é ser o bom pagador do tipo que paga à vista, pois esse
consegue passar bem longe de juros exorbitantes e não acaba pagando o pato por
ninguém.
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